Em era de crise, golfe busca novo rumo

     Desporto           
  • Luanda     Segunda, 07 Junho De 2021    20h57  
Campo de Golfe do Morro dos Veados
Campo de Golfe do Morro dos Veados
Marcelino Camões

Luanda – Em várias partes do mundo, incluindo em Angola, o golfe ainda é encarado como modalidade de elite, devido os altos custos do material, apesar da sua cada vez maior popularidade e de poder ser praticado por pessoas de todas as idades.

Por Marcelino Camões

Criada na Escócia medieval, a modalidade desportiva, jogada em campos de grama ou parques apropriados, já não é de todo desconhecida no país, onde se iniciou há 85 anos.

A massificação do golfe tem sido aposta das autoridades nacionais, nos últimos anos, mas é factual que os praticantes já tiveram melhores dias, sobretudo em termos de infra-estruturas.

Reza a história que o primeiro campo de golfe surgiu em 1935, no Alto da Catumbela, província de Benguela, seguido dos campos Musseke Kasaca, actual Bairro do Golfe, em Luanda, e posteriormente de outros nas cidades do Huambo, Dundo (Lunda Norte) e do Soyo (Zaire).

Segundos dados oficiais, o país tem hoje 200 praticantes efectivos e apenas três campos: do Morro dos Veados, construído há 74 anos, no Benfica, município de Talatona, dos Mangais, na Barra do Kwanza, município de Belas, e da Chevron, província de Cabinda.

Deste leque, dois (os últimos) são de carácter privado.

Tem sido, essencialmente, nestes locais, que os golfistas angolanos fazem uso dos tacos para massificarem o movimento, que continua a exigir investimentos do Estado e de outros parceiros.

O campo do Morro dos Veados, com extensão de cerca de 63 hectares (um hectare equivale a um campo de futebol com a dimensão de 90x120 m), é um exemplo do trabalho técnico que se vem fazendo em Angola, em prol da melhoria da qualidade das infra-estruturas para o golfe.

Actualmente, o campo apresenta uma imagem completamente renovada, deixando para trás a triste "fotografia" de um passado recente, em que estava tomado por capim,  situação que o tornava impraticável em tempos idos, quase em estado de abandono, como constatou a ANGOP durante uma reportagem sobre o estado da modalidade, particularmente em Luanda.

 A melhoria da imagem do campo deveu-se, essencialmente, à intervenção da direcção do Clube de Golfe de Luanda (CGL), liderada pela praticante Albina Assis, figura de referência da governação, que já ocupou cargos  como de ministra dos petróleos.

Conquanto, o recinto debate-se com o problema da vandalização, por terceiros, que realizam no local criado para a actividade desportiva, actividades religiosas, e, em alguns casos, actos de prostituição.

Durante a reportagem, neste domingo (dia 6), foi visível a presença de elementos estranhos ao fenómeno desportivo no Morro dos Veados, propriedade do CGL.

Enquanto golfistas participavam de vários torneios e outros jogavam para manutenção, volta e meia um grupo de pessoas atravessava o "green", ignorando todos os riscos de serem atingidos por uma bola e sofrerem lesões que podem levar à morte.

Ao longe vislumbram-se tendas e pessoas que praticam cultos religiosos, a quem se  atribuiu a responsabilidade dos resíduos sólidos que proliferam por algumas partes do terreno, como papéis, garrafas, sacos de plásticos, entre outros objectos.

 

Sobre esta situação, Manuel Barros, presidente do Conselho Técnico do Clube de Golfe de Luandaafirma que o órgão sobrevive das quotas de 200 sócios, e que a solução do campo passa por apoios do Ministério da Juventude e Desportos.

Aponta como prioridade a vedação do terreno, afirmando que a manutenção pode custar perto de Kz 600 mil/mês, incluindo o melhoramento substancial do salário aos quatro funcionários de limpeza, fixado em Kz 35 e 50 mil, além de outros serviços.   

Segundo a fonte, o projecto de vedação do campo, ao menos da parte frontal de três quilómetros, pode custar entre Kz cinco e dez milhões, apesar de reconhecer não ser a pessoa ideal para falar em números exactos neste quesito. 

 O bicampeão do torneio internacional TAP, em 1996 e 1997, em Portugal, e campeão do Open TAP-Brasil, em 2007, confirma as sucessivas invasões do espaço por várias pessoas, em nome de igrejas, mas com acções que transcendem o âmbito religioso.

Apela, por isso, à intervenção das autoridades policiais, de migração e fronteiras e do Conselho Nacional das Igrejas Cristãs, de modo a que o local deixe de ser usado de forma contrária ao seu objecto social exclusivo, ou seja, a prática do desporto.

O técnico de soldadura, que se iniciou na modalidade em 1973, denuncia a presença de pessoas estranhas, que praticam actos condenáveis, como feitiçaria e prostituição, muitas delas chegadas a Angola de forma duvidosa, sob alegada protecção de igrejas.

Para o professor de Golfe, trata-se de uma situação merecedora de intervenção do Serviço de Migração e Estrangeiros, que precisa de ser estancada para se conferir dignidade ao recinto e reduzir o risco de acidentes graves causados pela bola.

"Presidential Golf Day"

Conquanto, apesar das dificuldades e do forte cenário de crise económica que assola o país desde 2014, há sinais tímidos de maior investimento na modalidade do golfe.

Um desses sinais foi a realização, no campo dos Mangais, na Barra do Kwanza, do “Presidential Golf Day”, promovido em Maio de 2020, pelo Executivo angolano, visando promover o turismo, por via desta modalidade.

A prova, que atraiu para Angola importantes investidores estrangeiros, surgiu como mola impulsionadora do golfe, mas há quem diga que não correspondeu às expectativas.

Conforme Manuel Barros, nascido no Distrito Urbano do Rangel há 69 anos, 57 dos quais como jogador de golfe, um aspecto negativo daquela competição, realizada dia 18 de Maio de 2020, foi a não “inclusão de quadros entendidos na organização”.

No seu entendimento, a ausência fundamentalmente de técnicos do Clube de Golfe de Luanda e da Federação contribuiu para que a iniciativa pioneira em Angola, mas antiga em vários países do mundo, “não resultasse em ganhos para a modalidade”.

 Lembra que as expectativas dos fazedores deste desporto eram elevadas, mas até à data fica difícil explicar, em concreto, quem organizou a prova, não tendo sido, afirma, o Clube de Golfe de Luanda, o Ministério dos Desportos, os Mangais ou a Academia.

A fonte sugere, por isso, que sejam corrigidas as falhas identificadas na primeira edição do Presidential Golf Day, evento que procurou corporizar o desporto e o turismo, trazendo ao país distintas personalidades políticas e vários homens de negócios.

A prova surgiu no âmbito da política de diversificação da economia no país, tendo privilegiado áreas como o turismo e a agricultura.

Para abrilhantar o evento, foi anunciada a presença de 80 jogadores de uma comitiva de 300 representantes da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC), Reino Unido, Japão e Turquia, que competiriam no "green" da região do Cabo Ledo.

Entretanto, além da componente desportiva, Angola buscava a promoção e a interacção entre homens de negócios que fizeram parte do Fórum Mundial do Turismo, realizado entre 23 e 25 do mesmo mês de Maio, em Luanda.

A ideia era "apresentar" o país  por via deste desporto associado mundialmente à elite empresarial, visando a criação de condições de parcerias nos diversos domínios da economia nacional, à semelhança do que acontece em várias partes do mundo.

Esta iniciativa de carácter internacional marcou um passo importante para o relançamento do golfe em Angola, modalidade que vai conquistando novos praticantes, mas precisa de novo olhar e maior atenção dos empresários e das autoridades do Estado.

 



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