Vanganguelas conservam tradições seculares

Povos Khoisan
Povos Khoisan
José Cachiva - Angop

Menongue – Vanganguelas, Ganguelas ou, simplesmente, Nganguelas, é a designação de um grupo étnico que habita a região Leste e Sudeste do Planalto Central, em Angola, conhecido pela sua forte capacidade de conservar as tradições.

Por Simão José/Júlio Vilinga/Marcelino Camões, jornalistas da ANGOP

Este grupo, que representa 85 por cento da população da província do Cuando Cubango, com um total de  455 mil e 600, de um universo de 536 mil habitantes, congrega uma variedade de grupos étnicos que se destacaram desde a independência nacional (1975).

Integrado por diversas etnias, como os Vambundas (Mbunda ou Bundas), os Luenas (ou Lwena), os Luchazes (Lutchaze ou Lucazi) e os Luimbes (Lwembi), entre outros, tem o ganguela-Luchazi e mbunda como as suas principais línguas faladas.

A existência dos Ganguelas ou Nganguela começou a ser conhecida pelos europeus já no século XVII, por um duplo envolvimento nas redes comerciais desenvolvidas por estes no tráfico de escravos, a partir das províncias de Luanda e Benguela.

Do seu “Modus Vivendi”  destaca-se o comércio organizado no século XIX e XX, feito, essencialmente, à base de cera, mel, marfim e outros bens transaccionáveis.

Estes povos de Angola são ainda caracterizados pela tradição na agricultura e pela pecuária, sobretudo a ré-colecção e criação de pequenos animais.

Distinguem-se também pela identidade social e as respectivas línguas em relação aos povos vizinhos, como por exemplo os Chókwé, os Lundas e os Ovibundus.

A realidade demonstra que muitos europeus e também alguns angolanos urbanos de hoje têm tendências a considerar, erradamente, estes povos como Ovibundus.

Um dos aspectos marcantes da cultura dos Vaganguelas é a puberdade, chamada de Kucho, período em que a mulher é isolada da família, depois do 1º ciclo menstrual.

Durante o período de isolamento, a jovem mulher aprende todos os hábitos e costumes da região, como cuidar do lar, como receber a família e os visitantes.

Conforme a tradição, quando a jovem estiver no período menstrual, não pode confeccionar alimentos para os homens, sendo que naquele período é  isolada e substituída temporariamente nas tarefas por outra que não esteja na mesma condição.

De acordo com o historiador o director provincial da Cultura, Turismo e Juventude e Desporto, Luís Paulo Vinsunjo, na tradição dos Kum e Tchum, vulgos Koisans, no  primeiro ciclo menstrual, a mulher também fica isolada do resto da família, numa casota previamente construída, cabendo ao marido a tarefa de cantar à volta do espaço.

“Enquanto a cônjuge estiver em tal condição, o marido deve buscar alimentos como mel,  carne e frutos silvestres. A água provém de uma raiz denominada “Tum” usada em tempo de seca nas regiões sem rios”, reforçou.

Na tradição dos Kum, o homem conquista a mulher de um modo muito particular. As famílias ficam sentadas ou em pé em volta de uma fogueira e num jogo de toca no ombro da menina não comprometida ela sai a correr.

Caso ela volte ao ponto de partida, explica o especialista, significa que a resposta é não. Porém, se simular que tropeçou e cair é sinónimo de que a resposta é sim.

Para o historiador, o engraçado é que cabe ao homem buscar os proventos para a família de mata em mata, enquanto à mulher tem a tarefa de criar as infra-estruturas.

O alambamento

Actualmente, de acordo com a fonte, registam-se alterações na matriz do alabamento, sendo que no passado a cerimónia era tratada conforme a tradição, não havendo a apresentação e depois o pedido como tal.

Luís Visunjo afirmou que os Ovangaguela nunca se misturavam com outras tradições e dentro da preservação da cultura, os Nganguelas casavam-se apenas entre eles, existindo, actualmente, já outras variantes.

O especialista relatou casos de alambamento em que a mulher recebia uma enxada e dois  rolos pequenos de tabaco, numa época em que ainda se fazia ocupações, ou seja, quando uma filha estivesse concebida a família do homem ocupava-se dessa barriga se saísse uma menina para esposa do filho.

Durante o tempo de gestação, referiu, a família do rapaz prestava apoios dentro do espírito de compadre e comadre, levando assistência, num acordo apenas entre os pais, sem conhecimento dos visados.

Luís Visunjo lamenta o facto de a globalização ter rompido com todas as fronteiras, citando, como exemplo, as somas exigidas actualmente entre 50 a 150 mil kwanzas, além de bebidas como cerveja, gasosa e outras.

A circuncisão para os Vanganguela

A matriz na circuncisão provém da tradição Ovanganguelas realizada em ambos os sexos, a partir dos cinco anos de idade, em períodos particularmente alternados.

Os meninos são levados para uma zona que se prepara, conhecida como Lusumba, onde ficam acantonados.

Para cumprir os rituais, naquela altura, utilizava-se a mesma faca sem anestesia, mas hoje, tendo em conta os problemas das doenças venéreas, o processo é mais cuidadoso.

Naquele tempo, após o corte, o prepúcio era mostrado às mães e o menino levado ao Vamba, uma área com formato de cabana onde ficavam acantonados os Tundandas.

Durante tal período, dava-se assistência medicamentosa, mas, sobretudo, ensinava-se como comportar-se dentro de um lar, como receber as visitas, como preparar uma lavra tradicionalmente e uma educação sobre a vivência na comunidade.

Depois de tudo consumado, os pais preparam o regresso das crianças à casa, numa cerimónia de facho, que na língua Nganguela se denomina “Okulundulula Otudanda”, num acto festivo com figuras mascaradas, os chamados palhaço (Mbwangungu), pai de todas as crianças.

Na tradição dos Ovanganguela, cirurgião em Nganguela “Tchilue” era apenas um para todos Tundandas e havia mais velhos com perícia nesta matéria, utilizando facas.

O director provincial da Cultura, Turismo e Juventude e Desporto local afirmou que o Cuando Cubango é uma província etnolinguística heterogénea, com oito grupos etnolinguísticos, dos quais os Vanganguelas, com 85%  da população total da província.

No Rivungo, explicou, existem os Vamanhos, localizados no Dirico e Chambios, os Kum ou Tchum (vulgo Koisans), com a particularidade de uma nova denominação para os Koisans, que são escuros como os Bantus, mas com vistas pequenas e rasgadas, cabelos encaracolados e não se revêem nas outras etnias.

“Se os tratar de Koisan é pejorativo, se forem chamados de Ovassequeles ou Vankala é pior. Sentem-se lesados mas, por vezes, não reivindicam porque se dizem em inferioridade numérica”, argumentou.

Conforme a fonte, no Rivungo encontra-se outro grupo denominado Zamas, fora dos Kum ou Tchum, pois os Kum são povos que vivem nas zonas altas e os Tchum nas zonas baixas.

O historiador afirmou que os Zamas que se encontram no Rivungo trabalham a terra e criam animais, mas a sua característica fisionómica condiz com o grupo étnico Kuns, que habita na maior parte da província.

No mesmo município localizam-se ainda os Vabucucho, que se identificam por ambos, os Tu Tchokwes e os Ovibundus, que habitam na região do Rivungo e Mavinga.

Monumentos e sítios

Dados oficiais indicam que a província tem registado 58 lugares entre monumentos e sítios históricos, mas estão classificados apenas cinco.

Trata-se do Campo de Repressão Colonial do Missombo (vulgo cadeia do Missombo), o Forte Serpa Pinto (Forte de Menongue), o Memorial da Batalha do Cuito Cuanavale, que contempla o (Tumpo e a Pirâmide) e o Museu à Céu Aberto.

A província é ainda rica em zonas paisagísticas, no caso das quedas do Tchitchalala, na comuna do Cutato, do Makulugungu, na comuna de Vissati, o memorial de 31 de Outubro de 1914, da participação de Angola na primeira e segunda guerra mundial.

Mito ou verdade, Luís Visunju reportou a existência de algumas lagoas, como por exemplo da comuna do Lupiri, envolta em mistérios do antigamente.

Em outros tempos, de acordo com a legenda registada, era uma aldeia que se transformou em uma lagoa cujos habitantes desapareceram misteriosamente.

Gastronomia dos Vanganguelas

O prato forte para Menongue, Cuchi, Caiundo e Cuangar é o funge de milho, no leste da província encontra-se como prato forte o funge de bombó, massango e massambala.

O Cuando Cubango tem um prato conhecido por Mundjungu, na tradição dos Vanganguelas, kizaca com uma característica escorregadia muito especial, servindo também de afrodisíaco.

O responsável citou, igualmente, o Usse, também tratado por Usongo, o tortulho, o kamiongo, numa diversidade cultural em que cada um buscou os sub-grupos etnolinguísticos com os Vangaguelas a terem diferentes influências.

Os Vangaguelas que se encontram na localidade do Fio têm uma característica com desinência dos Ovubundus. Para os que estão no Cuito Cuanavale (Mavinga) encontram-se característica peculiar com os municípios do Moxico, como Kangamba, Lubala Nguimbo, por serem da mesma família.

Os residentes na orla fronteiriça com a Namíbia apresentam, igualmente, algumas características similares, enquanto os localizados no Rivungo têm a mesma desinência com os do Shangombo “Zâmbia”.

No domínio turístico     

No aspecto turístico, a província é rica em zonas paisagísticas e monumentos e sítios históricos. Para o efeito, está a ser elaborado um guia turístico da província, onde se quer elucidar as zonas e caracterização de cada grupo etnolinguístico.

Reconhecendo, no entanto, défice em termos  de infra-estruturas turísticas e também de unidades hoteleiras, fundamentalmente em Menongue.

O cenário é o mesmo a nível dos municípios, existindo apenas em Quangar duas unidades de maior referência. O resto resume-se em pequenas infra-estruturas.

O Cuando Cubango é a província com mais diversidade em termos de fauna, flora e recursos hídricos. Se contam mais de 300 mil espécies de animais.SJ/VM





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