Huambo – Há 40 anos, o grupo Katyavala "perfila" entre as organizações culturais femininas que mais se destacam na promoção da música e dança tradicional da região do Bailundo, província do Huambo, centro de Angola.
Por Valentino Yequenha, jornalista da ANGOP
Criado em 1983, o grupo desenvolveu-se e conquistou espaço a nível da província e do país, tornando-se, nos dias de hoje, um dos mais sonantes do mercado nacional no domínio da música e dança folclórica.
O grupo nasceu com a denominação Deolinda Rodrigues e, posteriormente, Grupo de Assalto (2000), em homenagem ao primeiro soberano Katiavala Buila, fundador, no século XVI, do Reino do Bailundo.
Nos primeiros 17 anos, a agremiação contava, também, com o envolvimento de homens, mas foi com a força das mulheres que alcançou o maior progresso, tendo por isso optado pela integração exclusiva do género feminino.
A promoção, preservação e valorização dos hábitos e costumes da cultura da região centro de Angola constituem a principal bandeira da agremiação, que actua regularmente em eventos institucionais, culturais e no Carnaval.
Nos seus desfiles, exibe vários tipos de danças tradicionais, como “elissemba”, “onhatcha”, “okatita”, “osawaya”, “okamusa”, “otchisosi”, “otchitiku”, “nawãsindikile”, entre outras típicas da cultura da região, seguidos de cânticos. O seu principal instrumento musical é o batuque.
A tenacidade das suas integrantes faz do grupo um dos mais acutilantes da região no resgate da ancestralidade do Reino do Bailundo e de toda etnia Ovimimbundu, traduzindo-se num verdadeiro exemplo de heroísmo da mulher africana na promoção, preservação e conservação dos valores culturais do continente.
Fruto dos seus feitos, que se repercutiram, também, no alcance da paz e reconciliação nacional (2002), o grupo, composto por mais de 100 membros, detém várias premiações em concursos e festivais culturais, bem como em desfiles carnavalescos, com destaque para o Prémio Nacional de Cultura e Artes, categoria de dança, em 2014.
A morte da líder
Em Maio último, o grupo Katyavala perdeu a sua líder, Júlia Nangueve, aos 61 anos de idade, vítima de doença. Mamã Júlia, como era carinhosamente tratada no grupo, foi uma das suas fundadoras, ao abraçar o projecto aos 21 anos, na companhia de outras mulheres que hoje continuam a dar o seu melhor para o engrandecimento do movimento.
A notícia apanhou a todos de surpresa, deixando desolado o colectivo que continua abalado, por perder uma líder que muito se bateu para o desenvolvimento da agremiação, desde a sua criação até aos dias de hoje.
De acordo com a secretária do Grupo, Mavildes de Assunção Alves, a morte da líder deixou um grande vazio no grupo, pela sua incansável luta para o bem da organização e de todos os seus membros.
"Neste momento, estamos a lutar para recuperar do impacto desta perda irreparável, que surge um ano depois da morte da nossa primeira secretária, mãe Natália”, prosseguiu.
O esforço, disse, com o apoio do reino do Bailundo, da Administração municipal e do Governo provincial, tem sido no sentido de manter a organização unida e coesa, de modo a continuar o trabalho e honrar a líder.
Da cultura à agricultura
Para garantir a auto-sustentabilidade do grupo e dos membros, a agremiação decidiu criar uma cooperativa agrícola, denominada “Tuaiolela Katiavala”.
A mesma dedica-se à produção de batata-doce, batata-rena, mandioca, soja, milho, feijão e hortícolas diversas, num espaço de mais de 16 hectares de terras aráveis.
Conforme Mavildes de Assunção Alves, parte da colheita, cujos resultados são bastantes satisfatórios, é direccionada para o consumo dos membros e o resto para a venda. Os valores arrecadados revertem para a caixa comunitária.
Em termos de projectos, disse que a cooperativa perspectiva a criação de gado bovino, caprino e suíno, além de aves.
Para a administradora municipal Adjunta do Bailundo para a Área Política Social e das Comunidades, Lami Neyuva Mateia, o grupo Katyavala é uma referência no desenvolvimento das comunidades.
A responsável ressalta a ajuda do grupo na moralização da sociedade, através das suas acções voltadas para o resgate da ancestralidade, divulgação e valorização dos hábitos e costumes do reino e de toda região centro do país.
As suas canções, no seu entender, estão cheias de lições que apelam os cidadãos para a necessidade de pautarem por boas práticas e boa convivência social, assim como para o cumprimento do dever cívico de participarem no processo de desenvolvimento do município.
O seu contributo no desenvolvimento das comunidades baseia-se, igualmente, no facto de possuir uma cooperativa agrícola, que muito tem ajudado na promoção da empregabilidade, combate à fome e à pobreza.
Por conta disso, a responsável reafirmou o compromisso da Administração Municipal de continuar a apoiar o grupo, que considera ser um verdadeiro dinamizador da cultura nacional e do desenvolvimento da municipalidade.
O director do Gabinete provincial da Cultura, Turismo, Juventude e Desportos, Jeremias Piedade Nambongue Chiessanga, também reafirmou o apoio ao grupo, destacando o potencial de canto da agremiação.
Na sua óptica, tem contribuído bastante para o desenvolvimento da cultura da província, da região e do país, em geral, através da sua dedicação no resgate e na preservação dos valores culturais.
O sociólogo Atanagildo Paulo destacou o facto de a agremiação ser constituída, unicamente, por mulheres, conferindo à colectividade um carácter especial.
"Com um pendor investigativo e manifestação cultural, este grupo, que ganhou uma dimensão nacional, tem elevado ao mais alto nível a cultura da região, contribuindo para a efectivação dos desafios de resgate dos valores, hábitos e costumes culturais locais ", sublinhou.
Para além do batuque, na sua actuação o grupo faz, igualmente, recurso a instrumentos como o “onhedjengo”, “ombulumbumba”, “katchenke”, “otchisandje”, “tchingunfu”, “kaluhi”, “kalyalya” e “olunguaya”.
Ao longo da sua existência, inspirou o surgimento de diversos grupos nos 11 dos municípios do Huambo, entre os quais o Katchitiopololo (Bailundo), Tuiula (Caála), Essandjo Liowingui (Huambo) e Deolinda Rodrigues (Ucuma). VKY/ALH/VM