Rixas crescem nos bairros de Luanda

     Sociedade           
  • Luanda     Segunda, 24 Janeiro De 2022    12h03  
Rixas de adolescentes e jovens nas ruas da província de Luanda
Rixas de adolescentes e jovens nas ruas da província de Luanda
Pedro Parente

Luanda – O relato de casos de rixa, incluindo a narração de cenas de canibalismo, entre grupos dos municípios da província de Luanda tem-se tornado alarmante, como relatam centenas de cidadãos que testemunharam episódios assustadores.

Esta prática, cuja incidência já havia sido controlada pelas autoridades policiais, tem vindo a crescer, nos últimos anos, de acordo com centenas de cidadãos que testemunharam episódios assustadores.  

Munidos de catanas, facas, machados, varapaus e armas de fogo, os grupos, geralmente compostos por 15 a 30 adolescentes e jovens, deixam um rasto de destruição por onde passam.

Esses grupos, que também incluem crianças dos oito aos 13 anos, atacam quem passa, destroem tudo à sua volta, inclusivamente com o registo de vandalização de residências, quando percebem que um elemento do grupo rival está refugiado numa determinada casa.

Este ano, um jovem de 23 anos foi morto e lhe foram retirados os órgãos genitais, no bairro do Kalawenda, município do Cazenga, durante uma rixa entre grupos rivais. A morte desse rapaz é a primeira deste ano, mas soma-se às dezenas registadas em 2021 com as mesmas motivações.

A rixa envolveu jovens e adolescentes dos bairros Kalawenda e Malueca, que limitam os municípios de Cacuaco e Cazenga. A vítima pertencia ao grupo denominado o "Estado do Tita", e foi morto com golpes de faca no tórax, desferido por um elemento do grupo a "Turma do Peixe" e de seguida lhe foram decepados os órgãos genitais.

Relatos de alguns moradores indicam que sempre que se regista um confronto, é da praxe retirar os órgãos genitais dos rivais, pendurá-los como troféu ou mesmo serem comidos por todos os membros do grupo vencedor.

Essa actuação não é de hoje. Na década de 2000, jovens e adolescentes de Luanda começaram a formar grupos de rua, como os "HDA", "Alameda Squad" e "Morreu", entre outros, que praticavam actividades marginais em espaços geográficos pré-determinados no centro da cidade e bairros periféricos, com o envolvimento em rixas.

Uma fonte do Serviço de Investigação Criminal (SIC), que trabalha no assunto, explicou que é função da polícia deter os infractores. Disse que não existe, neste momento, uma estatística real de quantos grupos existem nos bairros, com realce para os de Cacuaco, alguns distritos de Luanda, Viana, Cazenga e Kilamba Kiaxi.

A fonte destacou, no entanto, o distrito da Estalagem (Viana), os bairros da Madeira e de Calemba (Luanda), tendo lamentado a falta da cultura de denúncia dos vizinhos, pais e encarregados de educação.

Afirmou que muitos integrantes dos grupos são inimputáveis, por serem menores de idade, mas existe um trabalho conjunto de operativos do e da Polícia Nacional (PN) que tem a missão de cadastrar os membros dos grupos e todos os seus integrantes.

“São filhos de parentes, familiares próximos, primos, sobrinhos e vizinhos, que nas suas acções contra outros grupos utilizam objectos cortantes como fragmentos de garrafas, facas e catanas, causando ferimentos graves e em alguns casos mortes entre eles e inocentes”, sublinhou.

Envolvimento dos munícipes

O distrito da Sapú, município do Kilamba Kiaxi, foi palco, em Novembro de 2021, de lutas entre vários grupos, com destaque para "Os Capuches", "King’s", "Mini Skiny" e "MP3", com jovens entre os 14 e 25 anos, munidos de pedras, catanas, paus e garrafas em chamas, confrontavam-se nas ruas, causando pânico e medo aos moradores.

Os responsáveis da Polícia Nacional na zona disponibilizaram um determinado número de operacionais para combater essa situação, que tem perturbado os munícipes.

Fruto de denúncias, o Comando Municipal PN, conjuntamente com o SIC, realizou operações que culminaram com a detenção de pelo menos 12 membros desses grupos.

Os moradores da Sapú mostraram-se disponíveis em colaborar com as autoridades policiais no sentido de pôr fim às rixas entre grupos.

Na mesma senda, a comissão de moradores do bairro Maria Eugénia Neto reuniu-se, em Dezembro de 2021, com agentes da PN do Comando da Sapú, e comprometeu-se a denunciar e fornecer informações às autoridades sobre a deliquêcia na área, inclusive os locais de reunião dos jovens para planificar as suas acções.

O morador Pedro Manuel observou que é preciso que os pais tenham coragem para confrontar os filhos e dizer-lhes para deixarem de praticar esses actos, pois todos sabem quem são as pessoas que fomentam essas confusões.

Segundo Rafael Garcia, morador do mesmo bairro, os últimos meses foram de puro terror, porque não se circulava à vontade, com o risco de ser atingido por uma pedra ou mesmo por uma catana.

Já Jorge Zua, do Camama, referiu que os jovens começam com lutas e terminam com invasões às moradias de inocentes, roubando tudo de valor que encontram. Considerou fundamental a conjugação de esforços para terminar com as rixas que causam feridos graves e às vezes mortes.

A moradora do Golf2 Georgina Carlos reconheceu que muitos familiares sabem que os filhos ou mesmo irmãos participam dessas "guerras", mas não fazem absolutamente nada.

“Mesmo quando a polícia efectua operações de busca e captura saem em defesa dos parentes, argumentando que são inocentes”, deplorou.

Soluções

No Cazenga, pelo menos 40 jovens integrantes de grupos de rixas beneficiaram, em 2021, de bolsas e estágios profissionais nos centros de formação do Instituto Nacional de Formação Profissional (INEFOP), numa iniciativa da JMPLA (a organização juvenil do MPLA), em  parceira com outras instituições sociais.

O objectivo é engajar os jovens em vários projectos, com destaque para, numa primeira fase, a carpintaria, serralharia, ladrilhagem, mecânica, electricidade, pintura, decoração e pastelaria, e, na segunda fase, receberam estágios profissionais para serem inseridos no mercado de trabalho.

O primeiro secretário da JMPLA no distrito urbano do Cazenga, Abel Júlio, disse que foi possível recrutar os jovens durante um encontro com os implicados em rixas, assaltos em residências e nas ruas, indicando que os mesmos podem contribuir para o desenvolvimento da sociedade.

Notou, a título de exemplo, que os jovens que pertenciam ao grupo denominado “Sem lei” entregaram 10 catanas com as quais praticavam as arruaças, iniciativa que serviu para desencorajar outros grupos envolvidos nessas práticas.

No distrito urbano do Kalawenda, integrantes de dois grupos de marginais em confronto destruíram vários bens, vandalizaram residências e estabelecimentos comerciais, junto do Hospital Municipal do Cazenga (Somague), situação que obrigou ao encerramento de vários serviços, segundo os moradores.

Agastados com as constantes lutas de gangs, roubos e violações, os munícipes pediram a intervenção da PN e apontaram o desentendimento dos meliantes do bairro Terra Vermelha como a causa da insegurança na zona.

O munícipe Francisco Sebastião, residente no Cazenga, pediu a intervenção da Polícia Nacional nas paragens de táxis, devido às lutas entre jovens que se intitulam lotadores, mas pertencentes a grupos de meliantes.

O presidente da Associação Delinquência Fora das Ruas, Matias Correia, frisou que a sua agremiação trabalha na sensibilização dos jovens nas comunidades para que deixem o mundo do crime e se dediquem aos estudos.

Adiantou que, durante os 10 anos de existência da associação, vários jovens abandonaram o mundo de crime, entregaram às autoridades as armas brancas e de fogo que utilizavam no cometimento de  crimes e dedicam-se actualmente a acções socialmente úteis à sociedade.

O responsável da Comissão de Moradores do Cazenga, António Kiambata, disse que várias residências são vandalizadas com frequência quando se registam rixas entre os grupos e em consequência da confusão registam-se roubos e às vezes mortes.

No Rangel, município de Luanda, o Clube de Judo conta com um projecto denominado “Guinbame Wami”, para a retirada de jovens das rixas, com a inserção dos mesmos na prática de actividades desportivas.

O referido projecto, desenvolvido em parceria com a Associação dos Jovens Unidos do Distrito (AJUDAR), já retirou 20 jovens dos grupos "Squadrão Bilo", "The Demerca", "Os Canal 1" e "Os Dequentura", entre outros.

Em declarações à ANGOP, o promotor do projecto, Edson Júlio, disse que os jovens pertenciam aos grupos que participavam em lutas no bairro Rangel, tendo sido possível convencê-los a sair dessa vida.

Esclareceu que dois jovens foram enquadrados numa oficina na rua da TAAG, para aprendizagem de uma profissão. Acrescentou que, no âmbito da parceria existente com o Centro de Formação do São Domingos do Sávio, da Igreja Católica, foram disponibilizadas 10 bolsas na área de Informática, Gestão de Recursos Humanos e de Administração de Redes.

Reconheceu que ainda existem grupos de rixas em acção, mas disse que o confronto entre os grupos diminuiu consideravelmente.





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