Vandalismo cresce nos cemitérios

     Sociedade           
  • Luanda     Quarta, 02 Novembro De 2022    16h06  
Interior de um cemitério (Ilustração)
Interior de um cemitério (Ilustração)
Domingos Cardoso - ANGOP

Luanda – A falta de reverência aos cemitérios tem sido uma prática cada vez mais evidente em Luanda, onde milhares de cidadãos vandalizam, todos os dias, urnas, campas e jazigos à luz do dia.

Por António Neto 

Esse fenómeno, também registado em outras partes do país, põe em causa a paz dos entes queridos, desrespeitados, sistematicamente, pela sociedade. 

Se, há mais ou menos duas décadas, os cemitérios em Angola eram considerados lugares santos, hoje vão perdendo a sua mística, muito por culpa da globalização.

Nos últimos anos, o desrespeito acorre no interior e exterior dos vários cemitérios, contrariando hábitos dos antepassados, baseados no respeito aos mortos.

Quem se desloca hoje aos "campos santos" de Luanda, cidade com mais de sete milhões de habitantes e múltiplas matrizes culturais, facilmente se depara com diferentes práticas menos aceitáveis. 

Entre essas práticas, destacam-se o uso abusivo de telefones móveis, de roupas inapropriadas para actos fúnebres e o consumo de drogas, além da vandalização de campas e dos seus acessórios. 

Trata-se de acções muito frequentes nos cemitérios da Mulemba (14), de Viana e Camama, para onde dezenas de cidadãos afluíram esta quarta-feira, dia dedicado aos finados, para venerarem os mortos.

A vandalização dos cemitérios em Luanda é uma evidência real da acentuada crise de valores nas famílias e da perda de amor ao próximo, incluindo aos mortos.

De acordo com o padre Luigino Frattin, da Igreja Católica, o dia dos finados (2 de Novembro) deve servir para a sociedade reflectir à volta da necessidade do respeito aos falecidos e campos santos.

O religioso reprova a vandalização que  ocorre nos campos santos, sublinhando que quem não tem respeito pelos mortos não tem respeito pelos vivos.

"A atenção pelas campas não é em si um respeito pelos objectos, mas por aqueles que estão enterrados e vivem em Deus", comenta.

Por sua vez, a cidadã Eleonor Sabão apela  à sociedade para deixar esta pratica, e solicita o reforço do policiamento nos cemitérios, uma vez que muitos "procuram por ossos e crânios humanos".

Abílio Vunge, por sua vez, reprova os constantes actos de vandalização dos cemitérios, considerando ser uma situação que demonstra a perda do sentimento humano, da ética e do desvio aos ensinamentos dos antepassados.

Para o ancião Manuel Miguel, a falta de respeito nos campos santos já se considera assustadora, porque envolve, inclusive, crianças, adolescentes e jovens.

"Nos tempos passados, era quase proibido uma criança ver um corpo ou então ir a um funeral, porque havia uma doutrina rígida dentro da família. Só viam o cadáver e iam ao funeral os mais velhos. Hoje, as coisas inverteram bastante", lamenta.  

Sociólogo reprova atitude da sociedade  

Segundo o sociólogo Pedro de Castro Maria, trata-se de atitudes reprovadas, que demonstram a crise de valores morais e cívicos reinante na sociedade angolana. 

"Mesmo aquilo que, por vezes, chamamos de mito tem uma função social muito importante, na medida em que nos ajuda a respeitar os espaços sagrados”, refere.

Pedro de Castro Maria afirma que muitas pessoas acham que os mortos não terão influência nas suas vidas, por isso perderam o respeito e o medo, fazendo dos campos santos espaços quaisquer.

O sociólogo reafirma a necessidade de as pessoas perceberem que estes espaços servem para meditação e reflexão, apelando à intervenção da polícia para se pôr cobro à situação dos cemitérios.
  
Para a secretária-geral do Conselho de Igrejas Cristãs em Angola (CICA), Deolinda Dorca Teca, a situação é lamentável, por mexer com cada uma das famílias.

"Estes actos mexem com cada um de nós, os mortos merecem descanso, a morte acompanha a cada um de nós", sublinha.

Deolinda Dorca Teca considera necessário que cada um possa respeitar o espaço onde repousam os restos mortais dos entes queridos, sublinhando que não existem motivos para desenterrar um cadáver, de forma violenta, para proveito de roupas, caixões ou outros objectos.

Em relação ao uso abusivo de telemóveis, drogas e roupas inapropriadas, a reverenda referiu que os actos fúnebres são um momento de reflexão sobre o que a pessoa foi para cada um dos presentes.

"É um momento de acção de graças, por tudo quanto a vida desta pessoa nos ofereceu, por isso é necessário que as pessoas se comportem com todo respeito", recomenda.

O dia de finados é uma data celebrada para relembrar, homenagear e manter viva a memória de pessoas queridas, que já não se encontram no mundo dos vivos.

A data foi escolhida pela Igreja Católica, por ser subsequente ao dia de todos os santos, que se assinala a 01 de Novembro.

Este ano, o dia foi assinalado em Luanda com a realização de missas de acção de graças, lavagem e pintura das campas.

A ANGOP constatou nesses locais, durante uma reportagem a propósito do 2 de Novembro, a preocupação das famílias em limpar os túmulos dos seus entes queridos, ao mesmo tempo que várias campas eram vandalizadas.

É caso para dizer, que nem no Dia dos Finados os entes queridos conhecem a verdadeira paz de espírito, perturbada por cidadãos desprovidos de amor.

 



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